GDPR: o que muda com as novas regras de privacidade da UE

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Escândalos recentes tornaram mais evidente um problema de longa data intensificado pela democratização da internet: o tratamento dado pelas empresas às informações colidas dos internautas. O vazamento de dados de 87 milhões de usuários do Facebook à Cambridge Analytica foi o estopim de uma situação que já incomodava faz tempo — e que motivou, em 2016, a formulação da Regulação Geral de Proteção de Dados (GDPR), válida nos países da União Europeia, mas com efeitos no mundo todo.

A lei não vale apenas para serviços digitais, mas, em um mundo globalizado e digitalizado, eles acabam sendo o centro das atenções. E, para os usuários da internet, a GDPR representa uma vitória histórica, segundo especialistas. “Para o consumidor, a GDPR traz mais clareza e informação. Agora ele poderá ver como os dados são protegidos e usados”, diz José Eduardo Pieri, do escritório de advocacia Barbosa, Müssnich, Aragão. “A tendência é que a GDPR seja adotada em outras regiões”, afirma.

Na prática, o reflexo mais visível para os usuários que se cadastram em uma rede social, respondem a pesquisas de comportamento ou simplesmente dão seu e-mail a alguma empresa que atue na Europa, será, em vez de se deparar com contratos enormes e pouco didáticos, ter acesso a informações simplificadas que mostrem o que será feito com seus dados. “A questão do consentimento se torna central. O serviço terá de ser muito mais claro do que até então [sobre o uso dos dados coletados]. Provavelmente, veremos muito mais pop ups, explicando com que finalidade as informações serão usadas e como elas podem ser acessadas a qualquer momento”, diz Pieri.

Como resposta à legislação, os serviços digitais mais populares e as empresas que congregam várias utilidades criaram páginas que centralizam os recursos de transparência. É o que se vê no Google, por exemplo, quando se acessa as configurações de privacidade. A Microsoft também criou um ambiente em que se verifica informações desde o serviço de busca Bing até a assistente virtual Cortana. Já o Facebook prometeu adaptação total à GDPR no mundo todo, e mesmo o Instagram, tradicionalmente mais fechado à interatividade com os usuários, deverá ter, em breve, uma função para baixar todas as informações em posse da rede social.

Falta de confiança

A GDPR é a medida mais dura e ampla contra o desconforto crescente dos internautas em relação aos serviços digitais. No Brasil, onde casos como o da Netshoes também revelaram falhas de segurança no armazenamento de informações pessoais, não é diferente. Uma pesquisa da Veritas, companhia que fornece serviços e produtos de gerenciamento de dados a clientes empresariais, mostra que os brasileiros não estão satisfeitos com o que é feito de suas informações pelas empresas.

No levantamento, obtido com exclusividade pela Época NEGÓCIOS, 1 mil brasileiros foram perguntados sobre em que medida se acham bem informados sobre quais informações pessoais as companhias podem compartilhar com outros parceiros. Do total, 43,7% se dizem “moderadamente informados”, e 18% “não fazem ideia” do que pode ou não pode ser partilhado pelas empresas. Os 38,3% restantes se dizem bem informados sobre o tema.

Já quando questionados, com a possibilidade de múltiplas respostas, sobre o motivo pelo qual as empresas não tratam os dados de forma adequada, a ampla maioria (69,7%) diz que o lucro com o compartilhamento das informações é a resposta. 45,6% acham que as companhias simplesmente não possuem os meios e pessoal necessários para ter controle sobre as informações.

A situação pode afetar não só a integridade, mas também os balanços empresariais. Na pesquisa, 42,3% das pessoas consultadas dizem que deixariam de comprar ou usar os serviços de uma empresa que fizesse mal uso de seus dados. Outros 26,5% não só boicotariam o negócio, mas também passariam para um concorrente direto.

Grandes poderes, grandes responsabilidades

Se, com a GDPR, os consumidores passam a ter um trunfo sobre as empresas, é verdade também que eles terão que saber usá-lo bem. “Quando a lei dá maior clareza, mais informação, ela leva ao indivíduo mais ferramentas para a tomada de decisão. E, com isso, mais responsabilidade para ele. Pois, a partir do momento em que ele consente com o envio de seus dados, não irá poder dizer que eles foram usados à sua revelia”, diz Pieri.

Ou seja, da mesma forma que a falta de clareza prejudicava o usuário, agora ela não poderá mais servir como desculpa para uma reclamação. Clicar em “aceito” para as condições de privacidade colocadas pelo serviço digital poderá significar consentir com o envio de informações sensíveis, como bancárias ou íntimas. Prestar atenção sobre quais informações estão sendo passadas e como elas serão usadas é mais importante do que nunca, de acordo com o advogado. “Se uma mídia social diz que vai compartilhar os dados com outras redes sociais para dar ao indivíduo uma melhor navegação, ele terá maior dificuldade para argumentar que seu direito foi violado com o compartilhamento dessas informações. Ele será informado sobre o volume de dados, o motivo e o destino daquele compartilhamento”, afirma.

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