Por que há executivos pagando tão caro para aprender soft skills?

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Há sempre um executivo para lembrá-lo da fábula, não tão antiga assim, que o mundo corporativo ama proferir. “Um diretor perguntou ao CEO: por que investir todo nosso dinheiro nos funcionários, para eles crescerem, e deixarem a empresa? O CEO nem hesitou na resposta: mas, e se não investirmos, e eles ficarem?”. O dilema hoje ganha contornos mais dramáticos diante da transformação digital (que desfaz e refaz modelos de negócios) e do avanço da automação e da inteligência artificial (I.A.). O Fórum Ecônomico Mundial calcula que a I.A. já provocará o sumiço de cinco milhões de empregos até 2020. A consultoria McKinsey estima que robôs (físicos e digitais) farão sumir entre 400 milhões e 800 milhões de empregos até 2030. O CEO e o diretor têm agora outras dúvidas: mesmo que decidam investir nos funcionários, o que a equipe precisa aprender? 

Quem fica precisará oferecer mais do que conhecimento técnico. “As empresas falam em transformação digital, um processo que impacta todas as áreas e pessoas. Questionam-se como conseguirão mudar a forma de pensar, quebrar paradigmas e estimular as pessoas a trabalharem menos em silos e mais de forma colaborativa”, diz Ângela Pegas, headhunter da Egon Zehnder. Para recrutadores e executivos a chave é investir nas soft skills, mas com discernimento (voltaremos a esse ponto).

Soft skills são habilidades comportamentais, sociais e emocionais, em oposição às hard skills (conhecimentos técnicos e específicos). Incluem capacidades como: provocar engajamento, motivar, comunicar-se bem, adaptar-se facilmente e um modo de pensar voltado à resolução de problemas. Envolvem desenvolver a capacidade de “aprender a aprender”, buscar novos conhecimentos diante dos problemas que surgem. Servem para lidar com a transformação digital na empresa, administrar melhor a carreira e viver melhor.

Elas não são novidade — organizações sempre prezaram funcionários com essas características e outras, como espírito de liderança. Antes, porém, pensava-se nelas como características inatas, e não como um conjunto de habilidades que pudesse ser compreendido, analisado e ensinado. “As soft skills estão cada vez mais em pauta nas organizações, bem como no recrutamento”, diz o recrutador Daniel Faria, da Linco. Levantamento da edição de 2017 do Capgemini Digital Transformations Institute Survey mostra que 60% das empresas atualmente sofrem com a carência das chamadas soft skills. E mostra quais são as mais demandadas:

  • Colocar o consumidor no centro das preocupações (uma forma de empatia) (65%)
  • Paixão por aprender (64%)
  • Colaboração (63%)
  • Capacidade de decidir (62%)
  • Habilidade organizacional (61%)
  • Habilidade de lidar com ambiguidade (56%)
  • Mentalidade empreendedora (54%)
  • Capacidade de gerar mudanças (53%)

Aqui voltamos ao ponto já mencionado: é necessário discernimento para gastar na aquisição de soft skills. Como elas são difíceis de mensurar (como medir o que o aluno aprendeu ao fim de um curso?), representam um convite a picaretas diversos que se apresentem como professores, instrutores ou consultores. A lista também mostra por que todo profissional tem de avaliar cuidadosamente a decisão de investir num curso caro em busca de soft skills para si ou para os funcionários de sua organização. As habilidades na lista não são técnicas, mas compreende-se facilmente seu efeito benéfico na eficiência de um profissional ou de uma equipe. Não são simplesmente simpáticas.

Pascal Finette, chefe do Programa de Empreendedorismo e Inovação Aberta da escola de negócios Singularity University, tem crenças bem específicas a respeito das soft skills que causam impacto real: “acho que há um conjunto de habilidades que gira em torno de design thinking e também de resiliência. Ambas podem ser ensinadas e aprendidas”. Sofia Wingren, CEO da Hyper Island, também fecha o foco. “Queremos que nossos alunos desenvolvam capacidade de colaboração, aprendam a ouvir e a receber feedback”, afirma.

A exigência por soft skills também aumenta porque os limites entre profissões tradicionais se esvaem. É preciso estar pronto para se adaptar, buscar um novo conhecimento técnico, uma nova habilidade comportamental e trabalhar junto com colegas de áreas e formações completamente diferentes. É razoável hoje que um profissional de recursos humanos aprenda a lidar com ferramentas de inteligência artificial para selecionar talentos, um psicólogo tenha noções de programação, um advogado esteja por dentro de questões de cibersegurança e um designer consiga ser um “arquiteto de soluções web”. “A tendência é que as pessoas façam um pouco de tudo e tenham uma visão do todo. Penso que dizer ‘Não sou pago para fazer isso’ vai virar um ‘crime’ “, diz Tonia Casarin, jovem brasileira que venceu um desafio global da Singularity University.

A universidade americana, aliás, é uma das que tem atraído CEOs do mundo todo, que pagam caro, para abrir a cabeça e se preparar para esse futuro imprevisível. Com aulas de genética à neurociência, os líderes são estimulados a trabalharem em equipe, conviverem, criarem protótipos juntos. A Singularity não é a única. Uma série de novas escolas (Hyper Island, Berlin School of Creative Leadership, General Assembly, Minerva Schools), plataformas (edX, Coursera) e edtechs (Tera, Gama Academy, Idea9) tem surgido nos últimos cursos, vendo cursos que misturam hard skills com soft skills.

Fonte Época Negócios
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