Como a diretora do Facebook superou seu pior trauma

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No dia 1º de maio de 2015, Sheryl Sandberg, diretora de operações e “número 2” na hierarquia do Facebook, encontrou seu marido morto na sala de ginástica de um resort no México. Acometido por arritmia cardíaca, o empresário David Goldberg escorregou na esteira ergonômica e sofreu traumatismo craniano. Ele tinha 47 anos e era pai de duas crianças.

Convicta de que nunca superaria a tragédia, a executiva buscou a ajuda do psicólogo Adam Grant, professor premiado da Wharton School e seu amigo pessoal, que lhe disse que ela poderia sim sentir alegria novamente — ainda que a perspectiva soasse irreal. Juntos, eles estudaram os mecanismos por trás da superação de grandes dores, e reuniram suas principais conclusões no livro “Plano B”, publicado neste ano pelo selo Fontanar.

Violência, morte, doença, abuso, desemprego: todos nós sofremos algum tipo de perda em algum momento da vida, diz Grant em entrevista exclusiva ao site EXAME. “Mas são poucas as pessoas que sabem que podem construir resiliência para encarar esses desafios”, completa ele.

Eleito um “Jovem Líder Global” pelo Fórum Econômico Mundial, o psicólogo conta como ajudou Sandberg a neutralizar as armadilhas do luto e diz quais fatores contribuíram para que ela retomasse a rotina após a morte do parceiro. Segundo ele, o sofrimento da diretora do Facebook destruiu sua autoconfiança na volta ao trabalho. “No primeiro dia de retorno ao escritório, ela teve dificuldade para se concentrar em reuniões e disse ao seu chefe, Mark Zuckerberg, que estava trabalhando só com 25% da sua capacidade”, conta Grant.

Na entrevista, o autor de “Plano B” compartilha as principais lições extraídas da história de Sandberg e explica como a resiliência pode ser desenvolvida após uma tragédia — ou até antes que ela aconteça. Confira a seguir:

Como Sheryl Sandberg encontrou forças para lidar com a morte repentina do marido?

Sheryl se sentia oca, como se um grande vazio preenchesse seu coração e seus pulmões. Ela achava que deveria ter feito alguma coisa para curar a doença cardíaca de Dave, e que ela nunca mais iria sentir alegria em nenhuma esfera de sua vida. Psicólogos chamam essas armadilhas de “3 Ps”: vemos o problema como pessoal (“é minha culpa”), pervasivo (“vai arruinar todas as partes da minha vida”) e permanente (“vou me sentir assim para sempre”).

Para construir resiliência, precisamos aprender a rejeitar esses 3 Ps. Sheryl começou a superar a “pessoalização” do problema quando percebeu que não poderia ter diagnosticado a doença cardíaca de Dave, já que nem os médicos conseguiram fazer isso. Nem tudo que acontece conosco é decorrente das nossas ações.

Ela também passou a repensar o aspecto “pervasivo” do problema quando começou a registrar em um diário os momentos pelos quais se sentia grata, o que lhe mostrou que havia alegria em várias esferas de sua vida. Por fim, ela questionou a “permanência” da dor quando passou a substituir palavras como “nunca” e “sempre” por “neste momento” e “às vezes”. Em vez de dizer “Eu nunca mais vou sentir alegria”, ela começou a dizer a si mesma que “Neste momento, parece que eu não vou mais sentir alegria”.

Como a experiência de Sandberg pode inspirar quem está vivendo situações dolorosas em suas vidas pessoais e profissionais?

Ninguém tem uma vida perfeita. Em algum momento, todos nós precisamos encarar perdas. Todos sofrem com desemprego, violência, divórcio, doença, abuso. Mas são poucas as pessoas que sabem que podem construir resiliência para encarar esses desafios. Uma das maiores lições que aprendemos foi que ninguém tem uma quantidade fixa de resiliência. É como um músculo que pode ser desenvolvido.

Outra descoberta foi que nós ficamos mais resilientes pelos outros. Quando as pessoas que nós amamos precisam de nós, acabamos descobrindo uma força inesperada em nós mesmos. No caso de Sheryl, um grande fator por trás da sua recuperação foi saber que seus filhos precisavam dela. A resiliência não é algo que nós construímos sozinhos, é algo que desenvolvemos uns nos outros.

Em algum momento, após um grande trauma, é preciso dar um jeito de voltar a trabalhar. Qual é o primeiro passo para esse retorno?

Não existe um passo a passo que valha para todas as pessoas, porque não existe um jeito certo de viver o luto. Cada um sofre do seu próprio jeito e no seu próprio ritmo. Sheryl, especificamente, enfrentou dois grandes desafios na volta ao trabalho. O primeiro foi que o seu sofrimento destruiu a sua autoconfiança: ela achava que não conseguia sequer respirar, que dirá raciocinar.

No primeiro dia de retorno ao escritório, ela teve dificuldade para se concentrar em reuniões e disse ao seu chefe, Mark Zuckerberg, que estava trabalhando só com 25% da sua capacidade. Ele disse que preferia ter esses 25% dela do que não ter nada. Ela começou a falar de modo incoerente, mas ele destacou dois bons argumentos que ela tinha trazido. O apoio de pessoas confiáveis ajuda muito a reconstruir nossa autoconfiança.

O outro grande obstáculo de Sheryl foi o isolamento. Ela se sentia como um fantasma. Quando as pessoas a viam, não sabiam o que lhe dizer, então quase sempre ficavam em silêncio. Em geral, as pessoas perguntavam “Como você está?”, e ela queria gritar “Meu marido morreu, como você acha que eu estou?”.

Então ela escreveu um post no Facebook pedindo para as pessoas perguntarem “Como você está hoje?”, o que sutilmente indica que elas sabiam que Sheryl estava sofrendo. As pessoas atenderam a esse pedido, o que a fez se sentir menos solitária.

Um trauma pode ser completamente superado?

Todo mundo conhece o estresse pós-traumático, que afeta cerca de 15% da população. Mas poucas pessoas conhecem o crescimento pós-traumático, que é muito mais comum. O resultado do sofrimento muitas vezes é ganhar uma nova perspectiva sobre a vida, sentir mais força (“Se eu superei isto, posso superar qualquer coisa”) e gratidão (“A vida é mais frágil e mais preciosa do que eu imaginava”).

Esse crescimento não ocupa o lugar da tristeza; ele vem junto com ela. Mesmo quando a dor não vai embora completamente, ainda é possível construir algo valioso a partir dela. Um caminho é ajudar outras pessoas a superar aquilo que um dia nos machucou também. Isso não apenas dá significado às nossas vidas — também dá significado aos nossos sofrimentos.

É possível desenvolver resiliência de forma preventiva, isto é, antes de sofrer um baque?

Após escrever o livro, Sheryl e eu descobrimos que, além do crescimento pós-traumático, também é possível vivenciar um crescimento pré-traumático. Isto é, aprender essas lições sem vivenciar uma tragédia. Temos uma amiga, por exemplo, que começou a escrever cartas para todos os seus amigos nos seus aniversários, dizendo tudo que eles significam para ela. Ela está praticando gratidão e resiliência na rotina.

No livro, vocês dizem que todos nós estamos vivendo uma espécie de “plano B” em nossas carreiras ou vidas pessoais. Qual é o seu conselho para quem deseja superar o “plano A” e encontrar alegria com o “plano B”?

Uma atitude muito poderosa é anotar em um diário três momentos de felicidade que você viveu naquele dia. E repetir isso todas as noites. Psicólogos dizem que isso ajuda não apenas a perceber momentos felizes, mas também a buscá-los.

O diário foi a promessa de ano-novo de Sheryl para 2016, e isso não apenas iluminou as suas noites, mas também os seus dias. Quando algo feliz acontecia, ela pensava algo como: “Isso vai entrar para o diário!”. Outra boa medida é perseguir o estado de “flow”, aquele em que ficamos tão absorvidos em uma atividade que perdemos a noção do tempo, do lugar, e até de nós mesmos. Algumas pessoas experimentam isso correndo, dirigindo, cozinhando. Outras ficam tão imersas em um livro que até esquecem que os personagens não são reais. Precisamos dar permissão a nós mesmos para voltar a praticar essas atividades e encontrar tempo para elas.

 

Fonte Exame.com
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