Tecnologia em ritmo de ‘fast-fashion’

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“Ponha este fone e fale neste microfone. Você é a primeira pessoa que experimenta. A gente não tinha deixado ninguém usar”. O suave sotaque carioca contrasta com os olhos de Henrique Malvar, que movem-se com rapidez. Para ele, “o futuro não está muito longe, não”.

Malvar é o cientista-chefe da Microsoft, uma das maiores empresas de tecnologia do mundo, com investimento anual de US$ 11,4 bilhões em pesquisa e desenvolvimento. Rico, como é chamado pelos amigos, trabalha há 18 anos na companhia.

Antes disso, no Brasil, criou duas empresas, a Acron, que fabricava telefones que não podiam ser grampeados, e outra de processamento de sinais, a tecnologia que permite, por exemplo, transmitir textos, imagens e voz por uma linha telefônica. A burocracia e a concorrência de empresas estrangeiras, muito maiores, acabaram com a carreira do empreendedor.

Com PhD de engenharia elétrica e ciência da computação pelo MIT (Massachussets Institute of Technology), Malvar dava aulas na Universidade de Brasília, nos anos 90, quando mudou-se para os Estados Unidos, convidado por um antigo colega do MIT a trabalhar na empresa de video-conferência PictureTel (comprada depois pela Polycom). Anos depois, com vontade de avançar no campo da pesquisa, Malvar decidiu enviar um e-mail para a Microsoft, propondo a criação de uma unidade de processamento de sinais. Mandou no domingo à tarde e na segunda-feira foi recebido para uma entrevista. Meses depois mudou-se com a família para Seattle e está lá até hoje.

Na sede da companhia, em Redmond, no subúrbio de Seattle, Malvar aponta para seu laptop. No experimento inédito para pessoas de fora da Microsoft, ele pede para que eu converse com seu colega Will Lewis, gerente do projeto de tradução do Skype, que aparece na tela – eu, em português, Will, em inglês.

O computador, por meio do Skype, faz a tradução, em tempo real. Na parte inferior da tela, aparece o texto da fala de Will, em português. No fone, ouço a tradução.

O melhor é falar devagar. Se a voz é grave, o resultado é melhor. O sistema está sendo aperfeiçoado aos poucos – ainda não entende a palavra ‘goiabada’, por exemplo.

Mas o número de palavras não reconhecidas pelo computador vem caindo. No ano 2000, três a cada quatro não eram detectadas corretamente. Há cinco anos, esse índice caiu para 15%, e agora está em 5%. Quanto mais o sistema é usado, incorpora novas expressões e fica mais inteligente. A Microsoft contratou brasileiros, que “alimentam” o sistema desde o Brasil.

O novo serviço de voz e texto em português, a ser lançado em breve, faz parte de um grupo de seis línguas que a Microsoft já traduziu para o Skype – espanhol e chinês, entre elas. Depois do português, com sotaque brasileiro e não de Portugal.

O desafio de conversar e ser entendido pelo Skype é algo mais complexo do que incorporar um dicionário de palavras e expressões idiomáticas. Cada pessoa tem um jeito particular de falar, faz pausas, usa gírias, gagueja, muda o tom e a intensidade da voz. O computador tem que adaptar-se às idiossincrasias pessoais e, além disso, precisa “limpar” tudo o que não pode ser traduzido – incluindo palavrões, que não são traduzidos e não são registrados nem na língua original.

A nova ferramenta é um exemplo de como a Microsoft vem trabalhando desde o ano passado, sob o comando do CEO Satya Nadella: o ritmo para pesquisar e desenvolver produtos foi acelerado e há sinal verde para correr riscos. Se houver fracassos no meio do caminho, eles não devem ser encarados como grandes problemas. E ainda que se busque “o estado da arte” na área de pesquisa e desenvolvimento, nem todos os produtos e serviços precisam ser lançados nesse patamar de perfeição.

“Vamos atrás do risco, correr riscos. Temos recursos para fazer isso”, diz Malvar, cujo trabalho é ajudar a coordenar pesquisas e detectar quando vale a pena juntar uma equipe de pesquisa básica a um time de pesquisa aplicada, para criar um produto. Isso aconteceu, por exemplo, quando estava sendo feita a tradução do inglês para o mandarim no Skype.

Fonte: Valor

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