Como a publicidade usa a ciência para influenciar o que você compra

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Quanto é 2+2? Provavelmente, você respondeu a essa pergunta muito rápido. E quanto é 17×24? Dessa vez, teve que pensar mais, não é mesmo? Esses foram os exemplos usados por Flávia Ávila, economista e mestre em economia comportamental, para explicar que os humanos têm duas formas de pensar: a forma rápida (2+2) e a forma lenta (17×24). A grande maioria (95%) das decisões são tomadas pelo primeiro sistema — são aquelas escolhas quase inconscientes, para as quais não se pensa muito. E isso tem tudo a ver com o comportamento do consumidor e estratégias de marketing. “Ainda que a maior parte das decisões seja feita de forma rápida, a maior parte das estratégias são pensadas para o sistema lento, analítico”, disse ela.

Durante sua palestra no Neurobusiness Summit em São Paulo, Flávia deu alguns exemplos de como pequenas mudanças podem influenciar escolhas e de como a ciência comportamental pode ajudar as empresas a pensar estratégias.

Em primeiro lugar, disse ela, é preciso pensar quais gatilhos acionam o sistema rápido e o sistema lento de tomada de decisão. Afinal, se a maior parte das escolhas são tomadas no modo rápido, quase automático, talvez seja mais eficaz influenciar a decisão rápida do que tentar ativar o pensamento analítico e racional dos consumidores.

Como saber se a empresa está apostando na estratégia certa? Daí vem a importância de fazer vários testes, defende Flávia. Ela diz que as mudanças baseadas na economia comportamental mantêm a liberdade das pessoas, apenas dão “um empurrãozinho” na direção de uma decisão que a pessoa provavelmente tomaria de forma consciente.

A especialista listou alguns exemplos de experiências que mostraram como influenciar o comportamento:

1. Colocar uma opção muda preferências

Este experimento foi feito com um pacote de assinaturas da revista The Economist. Um grupo tinha três opções de escolha: a versão digital, por US$ 59; a versão impressa, por US$ 125; e a versão digital mais impressa, por US$ 125. Outra turma só tinha a opção digital e a digital mais impressa. No primeiro grupo, apenas 16% das pessoas escolheram a assinatura digital, nenhuma escolheu apenas a assinatura impressa e 84% escolheram a assinatura digital mais impressa. No outro grupo, que tinha apenas duas opções, 68% das pessoas escolheram a assinatura digital, enquanto apenas 32% optaram pela digital mais impressa. “O simples fato de colocar uma opção muda preferências.”

2. Mosca no mictório

O problema nesse caso é a sujeira nos banheiros masculinos. Distraídos, eles muitas vezes “erram a mira” no mictório. Avisos pedindo que ajudem a manter o local limpo não são lá muito eficazes. Mas um experimento mostrou-se quatro vezes mais eficiente: colocar um pequeno adesivo com a imagem de uma mosca. “Usando um processo quase de gamificação, os homens mal percebiam que estavam mudando o comportamento”, disse Flávia. Mas aquele pequeno ponto faz com que eles se concentrem – e diminuiu em 80% a sujeira.

3. Redução de velocidade

Um problema comum em todas as cidades do mundo é a questão da velocidade dos carros. Simplesmente multar quem supera o limite de velocidade não é suficiente para fazer com que as pessoas diminuam a velocidade. Flávia mostrou iniciativas nos Estados Unidos e Canadá que usavam ilusão de ótica para chamar a atenção dos motoristas. Uma imagem de uma menina brincando na via, em frente a uma escola, faz com que as pessoas dirijam mais devagar.

4. Escolha padrão

Escolher por fazer um plano de aposentadoria é uma escolha difícil que envolve muitas decisões. “Envolve a educação financeira, mas também tem a ver com a relação entre presente e futuro”, diz Flávia. Apesar de complexa, essa decisão pode ser influenciada com uma simples mudança no formulário. Quando um funcionário é contratado por uma empresa, muitas vezes é questionado se gostaria de entrar em um plano de aposentadoria complementar. Na maioria das vezes, a pessoa tem de assinalar a opção “sim, quero fazer um plano de aposentadoria complementar”, mas o simples fato de mudar o formulário para a opção “não, não quero fazer um plano de aposentadoria complementar” faz com que dobre a taxa de escolha, conforme mostrou um estudo. “As pessoas não querem tomar decisões difíceis, elas tendem a aceitar a opção default”, explica Flávia.

O mesmo padrão foi encontrado em taxa de doações de órgãos: mesmo em países culturalmente semelhantes, o número de pessoas que doa órgãos é muito influenciado pelo formulário. Em países onde as pessoas precisam ativamente fazer a opção pela doação, as taxas tendem a ser menores. “Custo de decisão é alto, a gente tende a não tomar essa decisão, deixar no automático”, afirma Flávia.

5. É melhor oferecer mais ou menos opções?

Um supermercado colocou em suas prateleiras 24 opções diferentes de geleias. Sessenta por cento das pessoas que passavam pelo corredor paravam para olhar, mas apenas 3% compraram algum dos produtos expostos. Em outro momento, o mesmo supermercado ofereceu apenas seis tipos de geleia. Nesse segundo estudo, 40% dos consumidores pararam para olhar as opções, mas 30% compraram. “O excesso de informações aumenta o custo da decisão, as pessoas vão pensar mais nas opções que têm e tendem a deixar a escolha para depois”, explica Flávia.

6. Uma simples frase muda tudo

Quando você recebe uma ligação de telemarketing, provavelmente fica irritado e tenta desligar logo o telefone, certo? Mas se você deixar que o atendente faça a proposta, é bom saber que a forma como ele te oferece uma promoção provavelmente vai influenciar a sua resposta. Fazer a mesma proposta usando uma frase diferente pode alterar a escolha dos consumidores, disse Flávia. Ela citou um estudo feito em uma empresa de telecomunicação. Foram testadas três formas básicas de oferecer uma promoção: você tem direito a, não perca essa promoção, ou economize. Quando os atendentes ofereciam algo falando que o cliente tinha direito a alguma coisa, as taxas de sucesso da proposta eram significativamente maiores do que nas outras. “A forma de enquadrar uma decisão muda resultados.”

7. Compare

Um grupo de estudantes estava tentando fazer com que as pessoas trocassem o ar condicionado pelo ventilador. Eles distribuíram folhetos com as mensagens “economize”, “salve o planeta”, “seja bom cidadão” e “seus vizinhos estão fazendo melhor”. A opção que mais teve impacto no comportamento foi a última. Comparar a ação de um consumidor com outros ajuda a mudar o comportamento. “Se a gente se refere a grupo próximo, a mudança de comportamento é mais significativa.”

8. Limite de compra

Limitar o número de produtos que cada consumidor pode comprar provavelmente vai diminuir o número de unidades que os clientes irão levar, certo? Errado. Flávia citou um estudo que avaliou três cenários em uma promoção de latas de sopa: em um deles, não havia limite; no segundo, cada consumidor podia levar quatro unidades; e no terceiro, o limite era de 12 latas por consumidor. No primeiro, cada um levou, em média, 3,3 latas. No segundo, cada um levou 3,5 latas. No último, os clientes saíram, em média, com 7 latas cada. “Isso acontece porque você tende a ancorar sua decisão em um número. Nesse caso, foi o limite de latas que cada um poderia levar.”

Fonte Época Negócios
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