BBB corporativo: programas permitem que empresa ‘espione’ funcionários em home office

N.D. é funcionária de um grande banco em Brasília. Desde que os números de infectados pela covid-19 voltaram a subir, no fim do ano passado, ela voltou a trabalhar de casa. Usa seu próprio laptop. Para que seus superiores monitorem seu trabalho, ela precisa manter um software de reuniões online constantemente ligado, inclusive a câmera, durante as oito horas de sua jornada de trabalho.

“Sinalizo tudo que estou fazendo: se estou no chat, estou disponível. Se saio da frente do computador, eles sabem. Mas geralmente informo antes que vou sair e por quanto tempo. Entendo que é uma situação nova e que eles precisam ter algum controle”, diz ela.

Mas essa situação de saber que você está sendo monitorado não é confortável. Em muitos casos, o funcionário sequer sabe que está sendo espionado, já que alguns softwares de monitoramento podem ser instalados à distância.

Existem no mercado, por exemplo, ferramentas que identificam tudo o que o colaborador faz durante o dia. Veja o que essas soluções medem:

  • Quantos e-mails profissionais foram enviados
  • Quem desliga a câmera em reuniões
  • O tempo que a pessoa fica na frente do computador
Existem ferramentas que vão além e fazem:
  • Capturas de tela de computador em intervalos aleatórios
  • Mostram todos sites e aplicativos visitados
  • Permitem a visualização das telas dos funcionários em tempo real
  • Montam relatórios com os aplicativos e programas mais usados
  • Contagem de cliques do mouse, rolagem de tela e acionamento de teclas
  • Trabalhar sem camisa ou de pijama também pode pegar mal. Existe um aplicativo que tira fotos com a webcam: o funcionário que trabalha em casa é fotografado em períodos predeterminados.

Como agir diante desse verdadeiro Big Brother corporativo? Alguns especialistas falam sobre a melhor conduta e como conseguir alguma paz de espírito para trabalhar.

Você trabalha no seu computador ou no da empresa?

Isso pode mudar todo o cenário. Se está usando um laptop fornecido pela companhia ou ferramentas de comunicação de propriedade do empregador (e-mails corporativos, programas como Slack), saiba que esses softwares de monitoramento podem estar instalados. “Isso não é contra a lei. É uma prerrogativa do empregador”, diz o advogado e economista Renato Opice Blum, especialista em proteção de dados.

Ou seja: tenha consciência de que tudo que você disser pode ser visto pela empresa. Faça conversas privadas em um dispositivo diferente.

E se o computador for meu?

Ainda assim precisa de cuidados. Existem softwares que o empregador pode instalar em seu computador apenas te enviando um link. Assim que você clica, a ferramenta é instalada.

Saiba também que se você conectar sua máquina ao computador do escritório por meio de uma ferramenta de área de trabalho remota ou usar uma rede privada virtual (VPN) fornecida pelo empregador, é a como se a pessoa estivesse trabalhando presencialmente de seu escritório.

Nesse caso, a lei ainda dá direito ao empregador de fazer o monitoramento de sua atividade profissional durante as horas de trabalho. “O que não pode é monitorar dados pessoais”, diz Blum. Também não é permitido que as companhias tornem públicas as informações obtidas por meio da vigilância.

Cuidado com a nuvem

Armazenamento em nuvem operado pelo empregador, como Google Docs ou Office 365, deve ser usado apenas para coisas do trabalho. Arquivos pessoais, guarde em outro lugar. Alguns empregadores usam ferramentas de monitoramento para sinalizar nomes de arquivos como “curriculo.docx”, “cv.docx” ou “resume.docx” para ficar de olho em funcionários que estão querendo pular fora do barco.

Evite fazer negócios pessoais

Levantamento divulgado na conferência Blackhat 2019, nos Estados Unidos, sobre segurança corporativa, mostrou que 28% dos funcionários gastam mais de duas horas na internet com atividades não relacionadas ao trabalho. Outros 24% gastam até uma hora. Isso dá pano para manga para que a empresa queira monitorar seu trabalho.

Precisa de tudo isso?

“Na minha opinião, se a empresa não consegue confiar no funcionário que ela mesma escolheu para o cargo, então o erro é dela. O processo seletivo foi falho”, diz Fellipe Couto, presidente da Vulpi, especializada em recursos humanos na área de tecnologia. “Quando se faz um processo seletivo bem-feito, a empresa consegue ter certeza que aquela pessoa é o colaborador certo para aquele trabalho e confia nele. Instalar um software de monitoramento – e não informar a pessoa –é uma falta de confiança. É a mesma coisa que ficar monitorando o WhatsApp do namorado ou da namorada”, diz o executivo.

O que pode ser feito?

Em alguns casos, a empresa informa que o monitoramento está sendo feito. Em outros, o próprio funcionário liga o monitoramento quando começa a jornada e desliga ao terminar. Mas se você não tem certeza, pode perguntar se algo relacionado está sendo feito. É seu direito. E para sua tranquilidade, você pode perguntar ao seu empregador quais informações eles coletam do seu computador de trabalho.

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