Quatro mudanças necessárias na indústria de alimentos, segundo a “sra. Inovadeira”

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Por Cristina Leonhardt

Até bem pouco tempo atrás, a maior parte das pessoas confundia grandes marcas com alta qualidade. O principal objetivo de uma indústria de alimentos era ser grande o suficiente para poder bancar publicidade. Chegando aí, estava feita. Criava a imagem de grande empresa e isso bastava. As coisas, contudo, vêm mudando.

Cristina Leonhardt é engenheira de alimentos, fundadora do site Sra. Inovadeira e diretora de inovação da Tacta Food School

A crise de confiança pela qual as grandes corporações passam se aprofundou desde 2008. No foco, desta vez, está a indústria de alimentos, sobretudo a Big Food (os conglomerados transnacionais, que possuem negócios em diferentes setores e em muitos países).

Após ter trabalhado cerca de 15 anos dentro da indústria de alimentos, venho, há dois, observando esse mercado de um ponto de vista um pouco mais neutro, à frente do site Sra Inovadeira. Temos mapeado como se movimentam as áreas de inovação e pesquisa e desenvolvimento (P&D) desse setor, o que tem sido lançado e como todos têm se comunicado – entre si e com o consumidor. Desse mapeamento, cinco áreas despontam como as principais zonas de mudança para as empresas interessadas em permanecer relevantes:

1) Foco em nutrição

A primeira delas é uma mudança de foco estratégico, da qual derivam todas as demais transformações. Quem produz alimentos deve ter foco em nutrição, não apenas disposição para rever eventuais erros passados. A indústria de alimentos precisa tomar para si a parcela de responsabilidade sobre a saúde da população (mesmo que a saúde da população não dependa apenas da indústria de alimentos). Um começo seria acolher o Guia Alimentar para a População Brasileira dentro do desenvolvimento de produtos. O Guia Alimentar, a despeito de críticas, oferece uma boa base para o que é uma alimentação saudável.

A próxima mudança é uma das nossas grandes bandeiras: transparência. Alimentos e bebidas são dois dos únicos produtos cujo consumo se dá pela ingestão (adicione à mistura os fármacos) e são feitos, paradoxalmente, por uma das indústrias mais fechadas que há. Iniciativas que buscam dar mais clareza a como funcionam essas empresas e também a produção dos alimentos – como a Food Babe, nos EUA, e a Põe no Rótulo e a Do Campo à Mesa, no Brasil – costumam encontrar grande oposição entre grupos mais conservadores. Contudo, ser transparente já não é mais escolha – a internet democratiza o acesso à informação e permite também que se verifica a veracidade daquilo que é dito.

Propagandas, rótulos, reviews, reportagens: tudo está sob constante escrutínio. Será que este alimento é tão saudável quanto diz? Posso confiar nesta lista de ingredientes? Aqui se fala que a produção é local, mas quem garante?

Não basta apenas se comunicar, há que se comunicar sincera e empaticamente, inclusive assumindo falhas. É uma proposta dura para quem gasta muito mais em marketing do que em P&D. A comunicação é uma via de mão dupla – e a próxima mudança está no modo como os alimentos são criados.

3) Produtos mais inovadores e relevantes

A indústria precisa aprender a escutar o seu usuário, com SACs mais preparados e ativos, que forneçam respostas reais às perguntas. Precisam também da aplicação de metodologias de desenvolvimento de produtos centradas na criação de valor para o usuário. Com seus grandes parques fabris, a indústria tem um claro incentivo ao desenvolvimento de produtos ao redor das tecnologias já instaladas. É comum vermos a Big Food lançando variações de seus próprios produtos. É uma iniciativa muito tímida, pouco expressiva, sobretudo, quando considerado o tamanho das equipes de inovação envolvidas. Enquanto isso, uma miríade de pequenos novos negócios lança produtos relevantes e únicos marcados por crescente personalização. As soluções são direcionadas para usuários específicos, voltadas para aqueles cujo o valor extrapola o preço.

4) Foco em variedade e não em escala

A personalização dos alimentos, que se acentuará com o entendimento da genômica e da nutrição individualizada, se traduz numa outra e necessária transformação: parques fabris mais flexíveis e adaptáveis, com foco na variedade, e não na escala produtiva. Ser muito grande, nestes tempos de mudanças rápidas, frequentes e imprevisíveis, tende a ser um passivo, não mais um ativo. O consumidor clama por mudanças. A indústria de alimentos pode optar por acompanhar o processo – ou então resignar-se, aceitando que outros players, mais flexíveis e com ouvidos mais abertos, venham atender a essas novas demandas.

Fonte Época Negócios
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