Elon Musk quer transformar oito setores – de energia a saúde

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O nome de Elon Musk é associado a muitas inovações: do carro (elétrico) às baterias (de lítio). É provável que você conheça o bilionário pela montadora Tesla, pela empresa de transporte e serviços espaciais SpaceX ou mesmo pelos seus tuítes polêmicos. Na semana passada, ele estava de olho no lançamento do Falcon, que já levou um carro Tesla ao espaço. Mas Musk tem planos muito mais ambiciosos — e para setores que vão além do de energia e aeroespacial.

Por meio de empresas como The Boring Company, OpenAI e Neuralink, ele está investindo no “trem do futuro”, em inteligência artificial e em soluções que diz serem disruptivas no setor de saúde. E há dezenas de outras companhias com a mão dele no negócio — seja como CEO, investidor, fundador ou apenas conselheiro (veja o gráfico abaixo). Mas, de todos estes projetos, o que tem potencial para ser realmente transformador?

A empresa de inteligência de mercado CB Insights reuniu números que explicam a dimensão dos investimentos de Musk em vários setores — bem como aquilo que tem mais potencial e o que, ao menos com base nas evidências atuais, é puro otimismo. Confira:

Energia

A CB Insights defende que há indícios hoje de que os negócios de Musk podem transformar radicalmente o setor de energia nos EUA, no sentido de eliminar o modelo atual de “serviços públicos”. Primeiro com a SolarCity e, agora, com a Tesla, Musk quer acabar com a dependência dos combustíveis fósseis.

O bilionário e empreendedor sugeriu o conceito daquilo que viria a se tornar a SolarCity a seus primos, Peter e Lundon Rive, em 2004. Mercado existia: os combustíveis fósseis e a energia nuclear estavam em baixa, o custo do watt da energia solar havia despencado e o preço dos painéis também. Ali, segundo a CB Insights, Musk e seus primos assumiram o desafio de tornar a energia solar “acessível e mainstream” — algo que não foi realizado por ora.

Já houve conquistas, no entanto. A empresa virou a maior fornecedora de sistemas solares residenciais do país, a partir de uma inovação que é muito mais financeira do que técnica. Quando a SolarCity chegou ao mercado, o custo para obter um telhado solar no mercado americano era de US$ 30 mil a US$ 50 mil pagos de forma antecipada. A empresa foi pioneira na estratégia de “arrendamento”, que permite que as pessoas adquiram seus telhados solares de forma gratuita, pagando os custos de instalação de forma parcelada. O que fez a demanda explodir. Segundo a GTM Research, os arrendamentos representaram 72% das novas instalações solares a partir de 2014.

A empresa, porém, enfrentou problemas financeiros, após usuários passarem a cancelar contratos em massa. Consumidores defendiam que os vendedores da SolarCity possuíam “táticas agressivas” e convenciam as pessoas a comprar, mesmo sem ter o dinheiro. Do outro lado, o time de vendas da SolarCity havia crescido muito, com metas enormes, sem acompanhar um ganho de receita da empresa. O preço das ações sofreu queda vertiginosa. Até que, em 2016, Musk comprou a empresa de seus primos por US$ 2 bilhões. E ele quer transformá-la em um negócio que vai muito além de colocar painéis no teto da casa de milhões de pessoas. Sua ideia é oferecer uma forma de as pessoas carregarem seus Teslas em casa, com os painéis solares.

Os pedidos para um painel que fosse capaz de fazer isso foram abertos em maio do ano passado e algumas instalações também ocorreram em casas de funcionários da Tesla. Mas a fábrica que os produz está enfrentando atrasos — assim como o Model 3 da Tesla, que tem enfrentado uma série consecutiva de problemas de produção. É disso, aliás, que vamos falar agora.

Automóveis

Os problemas do Model 3 são apenas o último capítulo da “montanha-russa” que tem sido a história da Tesla, segundo a CB Insights. Fundada em 2003, a Tesla foi o segundo projeto de Musk após a venda do PayPal. Mas é também um dos mais ambiciosos. A Tesla é uma fabricante de automóveis que trabalha para tornar as montadoras coisa do passado e que prevê um futuro que vai muito além do carro elétrico. A Tesla quer que ninguém dirija, quer um futuro no qual as pessoas possam alugar veículos e usar o tempo dentro deles para desenvolver outras habilidades — ou que simplesmente dormir enquanto o carro as leva ao seu destino. Esse futuro, embora otimista, parece distante. As ações crescem, a empresa atrai investidores e a pressão aumenta. Muitos acreditam que Musk pode realizar o futuro que prevê para Tesla, outros estão ressabiados.

O plano começou como prometido, com a criação de um carro esportivo (e caro): o Tesla Roadster. Então, veio o Tesla Model S, que foi o carro elétrico mais vendido no mundo entre 2015 e 2016. Mas, com custo inicial de US$ 70 mil, o veículo não era exatamente acessível. Enquanto isso, o mercado automotivo foi mudando. Reino Unido e França proíbiram as vendas de automóveis movidos a gasolina a partir de 2040; a GM anunciou que planeja 20 modelos elétricos rodando até 2023; e a Volvo disse que não produzirá mais carros movidos a combustível a partir de 2019. E a Tesla, o que fez? Acrescentou inteligência artificial ao negócio em 2016. Musk prometeu que os carros sairíam das fábricas com sensores de luzes, oito câmeras, reconhecimento de sinais de trânsito e até silencionadores do barulho externo. A tecnologia de piloto automático já foi lançada, disponível apenas no Model S e X. Mas os motoristas ainda não podem dormir em um Tesla — Musk diz que isso será possível em 2019.

Questionamentos maiores à empresa, porém, vieram com o início da produção da Model 3, prometido por Musk como o primeiro elétrico de massa do mercado. O modelo recebeu quase um milhão de pré-pedidos — o equivalente a mais de US$ 10 bilhões em possíveis vendas. Musk prometeu 1,5 mil unidades no terceiro trimestre de 2017 e até 20 mil em dezembro. A realidade? Apenas 260 unidades foram produzidas. A produção já foi postergada duas vezes. Enquanto isso, em uma estratégia de marketing para desviar atenção, Musk anunciava no Twitter que a Tesla desenvolvia “limpadores de pára-brisa inteligentes” e novos dispotivos de som e luz. Alguns analistas aconselharam Musk a parar de prometer e “entregar algo logo”.

Os desafios para os planos da Tesla são gigantescos. Mesmo deixando de lado os problemas do Model 3, existe a chance de o programa de aprendizado da máquina (machine learning) do Tesla não ser bem-sucedido. Há uma chance também de que o lobby das concessionárias de carros consiga aprovar medidas contra a Tesla ou, no mínimo, atrapalhar seus planos (a Tesla ignora as redes de revendedores tradicionais que são apoiadas por legislação em alguns estados). E há ainda um desafio que envolve dados, segundo a CB Insights. Todo o carro Tesla na estrada recebe atualizações de software e envia dados em tempo real usando uma rede, que receberá vários gigabytes de dados todos os meses. Não só será preciso lidar com eles como é necessário que as pessoas confiem em deixar seus dados de localização sendo compartilhados com Musk.

Telecomunicações

Os negócios de Musk parecem ter uma fórmula básica, segundo analisa a CB Insights. A maioria de seus projetos envolve encontrar uma “velha ideia”, que falhou por falta de uma tecnologia mais sofisticada, e colocar todos os melhores engenheiros do mundo trabalhando em cima daquilo. Foi assim, por exemplo, que a SpaceX foi concebida, empresa aeroespacial que quer levar, entre outras coisas, satélites ao espaço a custos mais baixos, para fornecer internet ao mundo todo.

A ideia de fornecer internet via satélite não foi de Musk. Mas muitas empresas surgiram nos anos 90 com esse intuito e falharam, prioritariamente, por não conseguirem bancar os desafios gigantes de logística e de levar tantos satélites para o espaço. Em 2015, Musk manifestou publicamente o desejo de conectar o mundo com internet via satélite. Em novembro de 2016, a SpaceX entrou com uma soliticação na Federal Communications Commission (FCC), para lançar 11 mil satélites ao longo de seis anos, o que seria suficiente para fornecer uma banda larga robusta de internet ao redor do mundo. Daí surgiu especificamente a Startlink, braço do negócio focado em telecomunicações. O desafio ainda é o custo de tudo isso. Mas a SpaceX já abaixou o preço de um lançamento de satélite em US$ 300 milhões. O Falcon Heavy, lançado em janeiro deste ano, custou US$ 90 milhões.

Além disso, um dos muitos projetos de Musk com a empresa é lançar foguetes reutilizáveis. O desafio continua sendo o custo do combustível. Segundo a CB Insights, um custo unitário abaixo de um milhão de dólares por missão tornaria possível lançar mais de 4 mil satélites de internet “com facilidade”. Esses satélites, uma vez no espaço, abrangeriam toda a Terra — incluindo áreas sem internet atualmente.

À medida que a empresa reduz o custo do lançamento e mais satélites entram no espaço, há chances cada vez maiores de que a SpaceX, nas palavras de Gavin Sheridan, “provoque a morte de redes terrestres”. Isso seria um grande golpe para a ideia de internet por satélite, que está estagnada em relação ao seu potencial há décadas. E esta não é a única “velha ideia” que Musk e suas empresas estão trabalhando para ressuscitar. Tem também um túnel à vácuo nessa história.

Transporte

Musk falou do Hyperloop pela primeira vez publicamente em 2012. Desde então, ele tem trabalhado com equipes da SpaceX e Tesla no projeto de desenvolver um trem que seria capaz de alcançar 1,2 mil quilômetros por hora. É uma velocidade três vezes mais rápida do que o trem-bala japonês da rede Shinkansen. E custaria apenas US$ 20 dólares. A tecnologia por trás do Hyperloop envolve a construção de um túnel que criaria um ambiente interno à vácuo e transportaria as pessoas em cápsulas.

Segundo análise da CB Insights, o Hyperloop poderia gerar disrupções em várias indústrias. A primeira delas: a de aviação comercial. Com exceção de viagens que cruzam oceanos, o Hyperloop poderia transportar pessoas de forma mais rápida e a um custo muito menor. As pessoas poderiam viajar longas distâncias com uma frequência muito maior, o que influencia o setor de turismo. Além disso, poderia influenciar o setor de logística. Quase metade de todos os bens que os americanos importam chegam através dos portos de Los Angeles e Long Beach. Catorze mil caminhões trazem esses bens para “armazéns e estaleiros ferroviários” em todo o sul da Califórnia. Eles movem cerca de 11 mil contêineres por dia e queimam cerca de 68 milhões de galões de combustível a cada ano, de acordo com a PwC.

Claro, porém, que o Hyperloop tem seus críticos. Alcançar o direito e as licenças exigidos para construir um trem acima do solo, além do custo da construção em si, condenou projetos ferroviários de alta velocidade por décadas. E a tecnologia do túnel à vácuo ainda não existe.

Infraestrutura

“O trânsito está me deixando louco. Vou construir uma máquina para escavar túneis e começar a cavar.” E foi assim que Elon Musk criou a Boring Company, empresa de nome pertinente, considerando o setor nada descolado em que irá atuar: infraestrutura. Os EUA não são líderes mundiais no setor. Olhando para a Europa e Ásia, por outro lado, os gastos são grandiosos. Com a Boring Company, Musk não quer apenas cavar túneis, mas descobrir qual é a melhor a forma levar tecnologia para a infraestrutura dos EUA.

Atualmente, a empresa desenvolve três grandes projetos. O primeiro é um túnel da SpaceX, em Hawthorne, na Califórnia, que não leva a lugar algum. É apenas uma forma da empresa pesquisar inovações. Musk afirma que uma de suas grandes metas é diminuir o custo de construção de um túnel: hoje, este valor é em média de US$ 1 bilhão por milha (1,6 quilômetro) — é preciso reduzi-lo, segundo Musk, para US$ 100 milhões por milha, para ser algo “economicamente viável”.

Além disso, a Boring Company quer construir túneis com metade do diâmetro que os túneis possuem hoje. Além de economizar milhões de dólares na construção, túneis com diâmetro menor poderiam ser construídos em grandes cidades. O que nos leva ao segundo grande projeto da Boring Company: um túnel em Los Angeles que livraria a cidade do tráfego congestionado.

O outro fator no custo de construção é a velocidade para escavar. As máquinas de perfuração de túnel (chamado no Brasil de “tatuzão”) são extremamente lentas. A Boring Company busca desenvolver uma tecnologia que, além de escavar mais rápido (o que toma 50% do tempo de construção de um túnel), também já o faria adicionando a camada de cimento (o que toma 50% do tempo).

O terceiro projeto da Boring Company é ainda mais radical: um túnel que ligaria Washington, DC, à cidade de Nova York. Este é um caminho que atualmente exige mais de quatro horas no volante, e quase três horas com o trem de alta velocidade (que só atinge alta velocidade em áreas onde não há alta densidade populacional). Musk acredita que com o túnel à vácuo, é possível realizar esse trajeto em 29 minutos.

Os planos do empresário com a Boring Company correm em paralelo com seus outros negócios importantes, mas ele vê um futuro integrado para tudo, segundo analisa a CB Insights. Os túneis nas cidades poderiam ser utilizados por carros elétricos da Tesla e a tecnologia desenvolvida neles é necessária para construir o Hyperloop. Além disso, poderia ajudar Musk a realizar seu sonho de levar 1 milhão de pessoas à Marte em um futuro não muito distante. Os túneis são fundamentais para essa visão. Se Musk vai construir uma colônia em Marte, a construção de uma rede de túneis é essencial. Sem experiência em construir infraestrutura na Terra, é improvável que vejamos a visão do projeto mais ambicioso do bilionário ser concluído em Marte.

Aeroespecial

Em 15 de dezembro de 2017, a SpaceX lançou uma missão de reabastecimento para a Estação Espacial Internacional. Esta foi a 13ª missão de reabastecimento do contrato da SpaceX com a Nasa e o 45º lançamento de um foguete Falcon. O marco foi importante porque tratava-se de um foguete inteiramente reutilizado. Para Musk, só assim a jornada espacial fará sentido. Se cada foguete for único, nunca deixaremos o planeta. Agora, se os foguetes forem como aviões, reutilizados para várias viagens, o espaço pode se tornar o equivalente a uma viagem áerea. Isso exige melhorar a relação custo-benefício. Um foguete da Nasa, por exemplo, fica no meio termo desta relação. O ônibus foi projeto para ser barato e reutilizável, mas o custo dos impulsionadores dos foguetes e do combustível restringe o programa espacial da agência.

Os foguetes da SpaceX já mostraram uma diminuição de até cinco vezes no custo, segundo a CB Insights. O problema é que Musk não quer somente chegar até Marte. Quer levar 1 milhão de pessoas para lá. Para isso, segundo ele, é preciso reduzir o custo em até 5 milhões por cento. Os veículos SpaceX usarão Methalox, uma combinação de metano e oxigênio. Para ter o metano, a SpaceX irá coletar componentes da própria atmosfera de Marte. Com isso, a empresa pode produzir todo o combustível que precisa para retornar à Terra.

Para realizar essa ponte entre Marte e Terra, a Space X não vê o Falcon como melhor opção. Está desenvolvendo o BFR (Big Falcon Rocket), que poderá levar 500 mil kg (contra 22,9 mil kg do Falcon). Mas antes de nos tornar marcianos, ainda somos terrestres. E, antes que o BFR seja construído, os outros foguetes Falcon ainda estão trabalhando para melhorar a vida neste planeta (e conectar as pessoas à internet). Isso faz parte da estratégia global que Musk aplica em todas suas empresas: crie algo realmente útil para usar agora, que financiará as suas loucuras do futuro.

Inteligência artificial

Seguindo os passos do Google com o AlphaGo e do Facebook com o DarkForest, Musk criou uma empresa de inteligência artificial (IA) para chamar de sua: a OpenAI. O foco não é o mercado. Para Musk, estudar a inteligência artificial é uma questão de vida ou morte. Ele defende que se a pesquisa de IA continuar seu caminho atual, a humanidade não tem futuro, já que seu desenvolvimento caminha para desenvolver uma inteligência maior que a dos homens e que questionará se os homens são mesmo necessários.

A OpenAI atua em dois campos. O primeiro é o de pesquisa. Musk atraiu, segundo a CB Insights, pesquisadores de referência nesse campo. Ao invés de seguir com os estudos em esquema de sigilo total, como Google, Apple e Facebook fazem, a OpenAI publica regularmente seus resultados e descobertas.

A segunda frente é de plataformas. A empresa quer que pesquisas de IA se integrem e “conversem”. O problema principal com a segurança da IA ​​se resume a uma pergunta simples: como podemos garantir que esta inteligência se transforme na inteligência queremos? A OpenAI está tentando liderar a pesquisa neste campo.

Ao contrário das empresas que condicionam seus esforços em retorno, a iniciativa de Musk não tem fins lucrativos. E não funciona sozinha, com acesso exclusivo à funcionários de Musk. O documento de problemas concretos sobre AI, divulgado pela empresa em 2016, incluiu pesquisadores do Google Brain, de Stanford e da UC Berkeley.

Saúde

A Neuralink foi anunciada sem o furor que envolve a maioria das empresas de Musk. Mas pode ser um dos projetos mais emocionantes do bilionário. Envolve a construção de interface homem-máquina (IHM), que ligará cérebros humanos diretamente aos computadores. Pesquisas com IHM são antigas, mas envolvem basicamente dois desafios:

– Baixa largura da banda: temos bilhões de neurônios, mas as IHM apenas gravam alguns. Isso dificulta o uso deles para qualquer sistema. Você poderia mover um cursor sobre uma tela com seu cérebro, mas você não conseguia tocar violão com a mente.
– O implante requer procedimento neurocirúrgico. Isso significa que é restrito a pessoas com uma necessidade de mudança de vida, e atualmente para aqueles para quem essa vida pode não ser muito longa.

A Neuralink quer construir uma alta largura de banda e que seja minimamente invasiva. O protótipo ainda precisa ser aprovado pelo órgão regulador americano para que os testes comecem em pacientes reais. Com a empresa, Musk quer aumentar o nível humano de inteligência, para que possamos construir uma inteligência mais conectada ao mundo digital antes que a IA supere a nossa.

Além disso, a Neuralink tem potencial para ajudar as pessoas que sofrem de AVC, neurodegeneração, câncer, lesões da medula espinhal, amputações e dezenas de outros problemas de saúde. Porém, quase um ano após seu lançamento, o site da empresa ainda consiste apenas em uma única página que destaca as vagas em aberto na companhia, incluindo engenheiros elétricos e de software.

Fonte Época Negócios
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