Os sete pontos de atenção do varejo neste segundo semestre

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Por Marcos Gouvêa de Souza

O varejo do segundo semestre no Brasil será marcado por uma série de fatores para além daqueles sazonais já previstos anualmente e que irão determinar mudanças relevantes no comportamento das vendas e dos resultados.

Eis uma lista dos sete pontos que devem ser considerados na revisão das previsões feitas anteriormente.

1) Copa do Mundo. Foram apenas dois jogos da seleção brasileira até o momento, repletos de emoção, mas o que se viu ainda não entusiasma a ponto de criar uma motivação adicional pela perspectiva de uma caminhada vitoriosa até a final. A Copa do Mundo de futebol tem no Brasil três efeitos, pelo menos, dos mais importantes no comportamento do consumo e do varejo.

Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral do Grupo GS& Gouvêa de Souza

Antes da Copa, com o natural entusiasmo que estimula a compra de televisores. Como pontuou, com grande sacada, o Magazine Luiza, não dá para ver esta Copa com o mesmo televisor em que foi assistido os 7×1 da Copa passada. Um pouco antes e durante a Copa, a mobilização para compra de produtos relacionados ao verde-amarelo-azul que coloca um pouco mais de cor na torcida e reúne amigos, família e colegas de trabalho em casa, bares e clubes, reforçando a venda de alimentação e bebidas.

E mais ao final do torneio, dependendo dos resultados, quando o “animus” pode se converter em forte emulador de confiança e consumo ou frustração que rima com retração.

O cenário até o momento está totalmente aberto e de difícil previsão em seu impacto no futuro.

2) Devolução de R$ 34 bilhões do PIS-PASEP vai injetar gás adicional no consumo. Essa devolução irá ocorrer no início deste segundo semestre e, estimativa conservadora, dependendo do momento em que for liberada, indica que algo entre 30 e 40% desse total poderá ser direcionado para o consumo e o varejo.

Importante lembrar que no primeiro semestre do ano passado o mercado foi afetado positivamente pela devolução do FGTS, que teria sido beneficiado em estimados R$ 7,2 bilhões e, no segundo semestre, pela liberação de R$ 15,9 bi do PIS-PASEP para cidadãos mais idosos, acima de 65 para homens e 62 para mulheres, e que isso ajudou no desempenho mais positivo do setor naqueles períodos.

Do valor a ser liberado, parte irá para saldar dívidas, que se encontram em patamar histórico bastante baixo, e outras serão destinadas para eventual poupança ou consumo.

3) Mais concorrência e promoções entre as maiores redes de supermercados. Na última semana, o CADE aprovou a venda do controle do Walmart para o fundo internacional Advent, que já anunciou Luiz Fazzio, ex-Carrefour, Walmart, Pão de Açúcar e Tok Stok, como novo CEO da empresa.

Em paralelo, com medidas de revisão da atuação em termos de estrutura, organização, formatos de lojas, bandeiras, canais e mercados, é previsível uma aceleração marcante na atuação da empresa, com maior agilidade e mais iniciativas para recuperar participação de mercado e melhoria de vendas e rentabilidade.

Essa mudança vai injetar ainda mais competitividade no setor e a recuperação de vendas e participação irá repercutir nos resultados e desempenho dos concorrentes mais diretos e também nos indiretos.

4) O enigma político. O segundo semestre será marcado pelos dois turnos das eleições para presidente e governadores. Se no quadro para governadores as perspectivas começam a ser melhor desenhadas, no cenário presidencial se torna cada vez mais obscuro e preocupante. A polarização que se desenha do candidato mais radical à direita e o que possa ser herdeiro do pensamento mais à esquerda, ante a ausência de uma definição mais equilibrada, liberal e progressista de centro, coloca o país, especialmente o setor empresarial, preocupado e cauteloso, postergando investimentos e contratação de funcionários para novos projetos. Quando não buscando outros mercados para novos investimentos ante a indefinição e as perspectivas locais.

Acreditamos anteriormente que estaríamos vivendo um descasamento crescente entre a política e o mundo real, mas as perspectivas sombrias de curto prazo fizeram recrusdecer as preocupações e a cautela nos investimentos têm sido marcante ante a polarização desenhada e promovida como está, postergando a recuperação do emprego e do mercado.

5) Crédito ao consumo caro e escasso. Nesse capítulo nada deve mudar. É o mesmo cenário que tivemos nos últimos cinco anos, reflexo de um comportamento cauteloso e a excessiva concentração do setor financeiro no Brasil. Apesar de tentativas tíbias do Banco Central de atuar pela redução da concentração, no curto prazo nada deverá se alterar no cenário onde os cinco maiores bancos do país representam 82% da atividade financeira total.

Tal cenário leva a uma timidez flagrante na oferta de crédito ao consumo, mesmo num quadro onde a inadimplência e o comprometimento da renda das famílias com dívidas estão nos menores patamares dos últimos, pelo menos, oito anos.

Não será por esse vetor que poderemos ter qualquer novidade neste segundo semestre. Ao contrário, a indefinição do quadro político pode até agravar a oferta de crédito ao consumo.

6) Massa salarial estável e sem crescimento real. Emprego e renda não crescerão no período, apesar de ser um período eleitoral, tradicionalmente gerador de emprego, ao menos por conta de investimento público. O quadro de incerteza afetando o setor privado e mais, as dificuldades para equilibrar as contas públicas não contribuirão para o aumento do emprego e da renda no período, o que determinará, conjugado com a baixa oferta de crédito, um quadro de menor potencial e propensão para consumo.

7) Quadro cambial pode afetar o comportamento da inflação. O que de mais positivo aconteceu nos últimos semestres no país foi o comportamento declinante da inflação que ensejou uma percepção positiva do consumidor e que impactou sua confiança, especialmente aquela que considera o longo prazo. Com a valorização do dólar nas últimas semanas, que não deverá retroagir por conta de seu vetor estrutural internacional, corremos o risco de um aumento da inflação no componente custos, que teria forte impacto na confiança do consumidor e seu comportamento no consumo e no varejo.

Esses elementos todos tiveram seu comportamento afetado por fatos mais recentes e que anteriormente não devem ter sido considerados nas estimativas realizadas pelas empresas e os negócios.

Este é o momento certo para ajuste de velas e direção para encarar o crescente desafio que é atuar empresarialmente no Brasil.

Se o longo prazo sempre permite manter o olhar no horizonte, no curto e médio prazos, temos que olhar com muito cuidado onde pisamos.

Como o Walmart global descobriu, o Brasil definitivamente não é nem simples e nem fácil, e exige flexibilidade, agilidade e, acima de tudo, muita resiliência.

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